O que podemos aprender sobre o mercado infantil com o grande sucesso Pretty Cure
As personagens da série Pretty Cure, que vai ao ar nos domingos de manhã, ganharam um grande apoio de garotas entre 3 e 6 anos de idade. As razões escondidas por trás de seu sucesso são o conceito de quebrar estereótipos, além de sua atenção para pequenos detalhes, o que satisfez o coração das crianças e assim como o de seus pais.
“Garotas querem lutar também!” Dessa ideia incomum, um sucesso nasceu
Em uma sociedade cheia de problemas como inflação, recesso e o declínio da taxa de natalidade, o mercado voltado para as crianças ainda é capaz de produzir resultados impressionantes – se souber jogar suas cartas. O anime Pretty Cure, voltado para meninas, deu-nos prova dessa verdade.
Desde o anime “Futari wa Pretty Cure”, que começou em Fevereiro de 2004, até o mais recente “HeartCatch PreCure”, a série vem sendo renovada a cada ano, e agora alcançou sua sétima temporada (sétimo ano). É um pioneiro do gênero bishoujo senshi, ultrapassando até “Sailor Moon”, que é considerado um sucesso atemporal, que durou 5 temporadas (5 anos, de 1992 a 1997).
Quero pensar por que esse anime se tornou um grande sucesso.
Aquele que criou essas personagens é um produtor da Toei Animation, Washio Takashi. Ele teve experiência com comércio exterior, editorias e canais locais de televisão, e ele entrou para a Toei em 1998. Enquanto trabalhava em canais locais, ele trabalhava mais com documentários; tinha pouca relação com anime. Ele viu um anúncio em um jornal da empresa, e quando tentou entrar para a empresa, sua única relação com animes tinha sido assistir à série Mazinger Z quando criança.
O mesmo Washio Takashi entrou para a empresa como produtor do anime original da Toei para o bloco das manhãs de domingo no canal Asahi TV, às 08:30hs. Os patrocinadores fizeram um pedido para que fosse feito um anime para crianças do sexo feminino. Como ele não estava no ramo por muito tempo, e não tinha experiência alguma com animação para garotas, ele teve que pensar muito em novas idéias.
É dito que Washio, que veio da geração de Kamen Rider e Ultraman, trabalhou desde o começo com a idéia de que séries de transformação com ação eram legais, e trabalhou em seu plano a partir daí. Pela minha própria perspectiva, se eu tivesse que pensar sobre isso, eu teria resistência contra a idéia de usar lutas como o foco principal de um programa voltado para o público feminino infantil. Talvez eu seja antiquado, mas se me pedissem para fazer um anime para garotas, eu usaria o conceito de cenas gentis e femininas como vida escolar e amizade.
Washio, porém, focou em sua idéia de batalhas. Aparentemente, na primeira proposta de Futari Wa Pretty Cure, ele escreveu na concepção da série: “Garotas querem lutar também!”. Isso é baseado na idéia de que não há muita diferença de sexos entre crianças muito novas. Elas brincam juntas nos parques e no pré. Washio acreditava que crianças muito novas, sejam elas meninos ou meninas, querem pular e correr por aí enquanto brincam.
Porém, a série não alcançou tanto sucesso só por causa disso. O conceito foi reforçado pelo que é chamado de testes de mercado. Pesquisadores buscaram de antemão aquilo que garotas já gostavam; por exemplo, que tipos de emprego, cores, animes e brinquedos elas se sentiam interessadas.
Acima de tudo, eles examinaram “Sailor Moon” em detalhes, o que pode ser chamado do trabalho supremo no gênero bishoujo senshi. Para entender o motivo pelo qual ele foi tão bem recebido pelas garotas, eles fizeram entrevistas e estudaram a construção da história.
Mas eles sabiam que fazer algo idêntico a “Sailor Moon” não era garantia de que ele fosse bem recebido pelas garotas, então eles começaram a trabalhar com novas visões.
Violência e roupas de banho não são bem-vindas. Meticulosamente criando um show para jovens garotas
A série Pretty Cure, de acordo com Nishio Daisuke, que produz a obra junto com Washio, é meticulosa com detalhes; pode-se até chamá-los de regras fundamentais.
Por exemplo, as personagens nunca acertam o rosto das pessoas. Eles nunca mostram coisas como roupas de banho ou peças íntimas. Quando as expectadoras do anime brincam de ser as personagens, há a possibilidade de elas machucarem alguém se imitarem as ações mostradas no programa. Portanto, há um esforço para não mostrar claramente cenas em que alguém acerta ou é acertado na face ou no abdômen. Porém, se elas são jogadas longe, se são jogadas na parede, quebrando-a – mesmo se as crianças quisessem imitar isso, elas não seriam capazes. Os criadores tiveram que imaginar situações com muito poder e dano que não pudessem ser imitadas.
Eles também decidiram parar de fazer coisas que adultos também gostariam. Por exemplo, mesmo que o público alvo de crianças goste do programa, se eles ousassem não mostrar as personagens em trajes de banho, o programa acabaria. Deve-se ter um clima de verão, eles pensavam. Ainda mais, se as personagens lutam com minissaias, era normal mostrar suas roupas íntimas. Porém, eles colocaram as personagens usando leggings para que isso não acontecesse, e tomaram a séria decisão de não mostrar suas calcinhas. Esses esforços geraram bons frutos, e aparentemente aquelas pessoas chamadas de ‘bishoujo otaku’ não são fãs das personagens de Pretty Cure. Essa é uma das maiores diferenças entre esse anime e Sailor Moon.
Além disso, ao criar a obra, Washio sempre a deu muita atenção. Ele sempre fez com que as personagens tivessem emoções realistas. O público alvo de Pretty Cure são as garotas de 3 a 6 anos de idade, e os pais normalmente assistem ao anime junto com ela. Em outras palavras, já que os adultos também assistirão ao programa, eles buscaram relatar emoções como “Eu fiquei irritado quando criei isso” ou “Essa parte me fez chorar” para que elas fluíssem naturalmente. Por essa razão, Washio sempre teve em mente o fluir inevitável e realista das emoções das personagens enquanto ele criou a obra. Pode-se dizer que ele buscou criar um trabalho autêntico sem excluir nada.
Quando o lucro caiu pela metade e havia a possibilidade da série terminar, eles começaram a trabalhar com colaborações
Atualmente, Pretty Cure está em seu sétimo ano, e está bem no meio de criar um novo recorde para o maior número de vezes que uma série para garotas foi renovada na TV. Ainda, a Bandai Corporation, que vende os brinquedos relacionados à série, lucrou por volta de 11 bilhões de ienes com a venda de itens das personagens no ano fiscal de 2009. Porém, ele não seguiu uma trajetória de crescimento ao longo de sua existência. Houve até um perigo de que a série pudesse não receber uma continuação.
Na temporada do terceiro ano, “Futari wa Pretty Cure Splash Star”, as personagens sofreram uma mudança completa. Como a série apresentava a intenção de continuar por vários anos, o conteúdo da história começou a se tornar complicado, e se tornou inacessível para aqueles que não acompanharam as personagens desde o começo. Ainda, se as personagens continuassem as mesmas, mesmo se o anime continuasse popular, a mercadoria dos patrocinadores não poderia ser refeita e as vendas cairiam.
Por essa razão, eles decidiram renovar as personagens, mas o tiro saiu pela culatra; elas foram desaprovadas pelo público, e o lucro dos produtos caiu quase pela metade, gerando 6 bilhões de ienes. Como é de se esperar, levados pelo risco que corriam, eles começaram debates calorosos sobre o futuro do show em seu quarto ano.
Quando eles eventualmente decidiram continuar em seu quarto ano, parece que eles estavam bem atentos à importância da colaboração. Os fabricantes de brinquedos, editoras de revistas e músicos associados com Pretty Cure compartilharam o sentimento de risco, e sentindo que eles deviam fazer algo, é dito que eles mudaram para um tipo de sistema de “Comitê Televisivo de Produção”. Os comitês de produção são muito comuns em produções de alto custo como filmes, mas não existem em programas de TV. Esse novo experimento envolveu as companhias citadas acima se unindo e compartilhando suas opiniões. Primeiramente eles apenas divulgavam números nas reuniões, como “esse produto vendeu tantas unidades” mas conforme o tempo passou, a colaboração começou a se tornar mais clara, com uma atmosfera do tipo “ok, usarei essa estratégia nesta área. Em retorno, você faria isso?”.
A chave do sucesso: Mirar na autenticidade e na opinião das mães
Eu gostaria de mencionar o trabalho da Bandai, o principal patrocinador do programa e um parceiro crucial no processo de colaboração.
Bandai convocou reuniões com a Toei freqüentemente, uma vez a cada semana. Nesses encontros, eles propuseram coisas como “Gostaríamos de trabalhar com esse tema” e em sua parte, Toei dava conselhos como “Que tal criar objetos um pouco mais dessa maneira?”. Essa parceria se estendeu pelos sete anos, e de acordo com Katano Ryouta, subchefe da divisão dos brinquedos para garotas, “sentimos como se eles fossem da nossa própria empresa, mais do que nossos companheiros de empresa de fato”.
O processo de desenvolvimento de um produto primeiramente envolve um time de oito pessoas pesquisando sobre aquilo que está na moda e em voga entre o povo, e depois pensando em maneiras de unir essas informações, como em um quebra-cabeça, para criar um produto de sucesso. Por exemplo, eles decidiram sugerir as “Sementes do coração” como o tema do ano depois de discussões em que idéias como “Quando éramos pequenos, adorávamos colecionar coisas pequenas e brilhantes” e “garotas hoje em dia adoram itens que se aseemelham a jóias” apareceram repetidas vezes.
Depois, eles repassam a idéia para que a Toei Animation produza um conceito que integre tanto os temas quanto os objetos (que se tornarão as mercadorias). Quando os conceitos das mercadorias se solidificam, a Bandai divide as funções, “quem fará os bonecos”, “quem fará os perfumes”, e cada grupo pensa nos detalhes de seu produto.
Eu tentei pesquisar o que está na moda dentre os produtos para garotas. Watanabe Juichi, gerente do time de marketing para esse tipo de produto, disse o seguinte: “Falando sobre aquilo que faz sucesso hoje em dia, não posso fazer nenhuma afirmação conclusiva, mas em vez de fazer o que está na moda, há uma intenção de criar produtos autênticos”. É isso que está por trás da afirmação de Washio quando ele diz que focou na importância da veracidade dos sentimentos quando ele criou o programa. A razão disso é que as mães são aquelas que tomam a decisão final de consumir os produtos, e é dito que elas são bem severas em suas escolhas.
Nos dias de hoje, especialmente, os julgamentos das mães são muito importantes. As mães vêem os produtos e instantaneamente julgam se o anime é bom ou não. Se elas dizem que não, seus filhos irão obedientemente adotar essa perspectiva, e pensar: “Se minha mãe pensa que ele não é bom, ele não é bom”. Portanto, os produtos devem ser pensados levando em conta a opinião e o gosto das mães.
É perceptível que a Bandai vem criando produtos que refletem a realidade do dia-a-dia. Brinquedos muito exagerados não se encaixam naquilo que as mães gostam. Já os que imitam celulares e computadores parecem vender bem. Celulares são uma das necessidades mais importantes para os adultos. Crianças querem tocá-los também. Porém, já que eles podem quebrar ou estragar, os adultos não deixam as crianças pegá-los. Então, eles dão a elas celulares de brinquedo. Eles são apresentados como: “Este é um celular para você usar. E ainda melhor, é um tipo especial que faz você se transformar!”.
Por outro lado, há certos tabus. Por exemplo, vilões não são usados nos produtos. De acordo com Murase Kazue, gerente do time de personagens da divisão de brinquedos para garotas, “Para garotos, (os vilões) se tornam mercadorias, como os monstros do Ultraman ou os robôs inimigos de Gundam”, mas eles não fazem parte das mercadorias com foco nas garotas. Isso é natural. É comum que os pais queiram que suas filhas de 3 a 6 anos cresçam sem nenhuma influência ruim.
Provavelmente influenciados pela taxa de natalidade decadente, os pais hoje em dia são totalmente fixados em seus filhos. Ainda que o mesmo possa ser dito sobre a vontade de comprar os produtos mencionados, o custo gasto neles não é insignificante. O “Heart Perfume”, vendido como o “perfume da transformação” tem um preço que gira em torno de 3465 ienes. Os bichinhos de pelúcia “Shypre” e “Coffret” (as mascotes da série), que amadurecem aprendendo a falar uma variada quantidade de palavras ao serem acariciados e cumprimentados, são vendidos a 6195 ienes. Os produtos da Bandai são normalmente vendidos a 3000 ienes.
Eles são claramente capazes de ler a mente dos pais que querem comprar produtos autênticos e de alta qualidade para suas filhas. Nesse caso, percebemos que um bom marketing aumenta o valor dado às mercadorias apesar da recessão.
Artigo por Noguchi Tomo, Doutor em Ciência Social da Waseda University.
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Artigo traduzido do inglês (perdão, não sei japonês para traduzir do original), encontrado no LiveJorunal dedicado à série, traduzido do original para inglês pela usuária bananaspice. O original japonês pode ser encontrado aqui.